Com a técnica resumida nessa página, cujo aspecto central foi a facilitação por estimulação repetitiva a 2 ou 3 Hz, Conejero e Deletis tiveram 100% de sucesso em monitorizar o nervo facial com potenciais motores córtico-bulbares (FcoMEP): em 99 pacientes (93 sem déficit e outros 6 com déficit leve a moderado - House Brackmann II ou III) de uma série de 100 cirurgias. Em apenas 1 deles, que já apresentava paresia moderada a severa (HB IV), os FcoMEPs não foram obtidos.
Outro aspecto que chama a atenção foi o sucesso em obter FcoMEPs estáveis com baixa intensidade de estímulo em 79% dos pacientes, o que permitiu monitorar de forma contínua durante toda a cirurgia, sem interferir na manipulação cirúrgica.
"The main advantage of this stimulation protocol is not only the higher and stable amplitude of FCoMEPs but also that these responses are obtained quickly (2 responses per second), using low intensity, and therefore not inducing movement to the surgical field."
Em outros 16%, em algum momento da cirurgia surgiu necessidade de aumento de intensidade para obter FcoMEPs, que passaram a ser feitos de forma intermitente.
Em 5 pacientes onde observaram queda de amplitude maior que 65%, 4 tiveram déficit transitório e 1 acordou sem déficit. Esse critério de alarme (<65%), estabelecido com base em análise ROC, resultou em sensibilidade de 89% e especificidade de 99% para prever déficit no pós-operatório.
Em 4 pacientes onde observaram abolição de FcoMEPs houve déficit severo que persistiu após 6 meses.
Kothbauer já havia observado, em 2017, na monitorização com MEPs em cirurgias de coluna, que trens repetitivos a 1-2Hz produziam aumento de resposta motora que atingia um platô após cerca de 7 ou 8 trens.
Conejero, nessa série, notou que a estimulação repetitiva produzia não só FcoMEPs de maior amplitude com menores intensidades de estímulo como com menos abalo muscular. Ainda não tomei conhecimento de algum estudo que tenha observado o mesmo, permitindo monitorização contínua com MEPs na maior parte das cirurgias espinais.
Além da facilitação, Conejero recomenda registro concomitante de "reflexo de piscamento" e atenção a duas situações que podem produzir falsos positivos ou falsos negativos.
Propagação de trens multipulso para aferência trigeminal: Trens multipulso na montagem C3-Cz ou C4-Cz podem evocar reflexo de piscamento por propagação a aferência supra-orbital do trigêmeo. Como a resposta R1 pode ter latência e morfologia indistinguível dos FcoMEPs, é preciso cautela ao interpretar alterações restritas à captação em Orbicular dos Olhos.
Trens multipulso produzindo facilitação periférica: como observado por Téllez em 2016 , ao usar intensidade de estímulo pouco abaixo do limiar que evoca resposta com pulso único, a ausência de resposta com pulso único nem sempre é garantia de que a resposta a multipulso foi produzida na via central. Na série de Conejero houve um falso negativo que parece ter sido produzido por esse fenômeno:
" In our series there was one patient (patient # 56) in whom we observed erratic behavior in FCoMEP that could be explained by this phenomenon. We recorded responses after the train and after the single stimuli. The next trial showed only a peripheral response, and the next one, elicited a response following the train but not after the single stimuli. At the end of the surgery, we recorded what we interpreted to be FCoMEP. This patient represented a false negative result and recovered consciousness with a moderate transient facial paresis"
Resumo da técnica:
Estimulação para FcoMEPs: Corkscrew C3/C4 (ânodo)-Cz (cátodo) Trens de 3-5 pulsos, 0.5ms, ISI 2ms, até 150mA seguidos de pulso único após 90ms, taxa de repetição 2-3Hz.
Estimulação para reflexo de piscamento: par de agulhas subdérmicas no ramo supra-orbital do V. Trem de 4 a 7 pulsos, 20-40mA, ISI 2ms. Fazer registro bilateral para controle de spread contralateral com intensidades de estímulo maiores. Eventualmente é necessário estimulação com duplo-trem com ITI de 20ms.
Captação para reflexo de piscamento: Época de análise 50ms. Banda 70-1200Hz.
Captação de FcoMEPs: Orbicularis oculi, nasalis, orbicularis oris, mentalis. Banda 50-1500Hz. FcoMEPs foram captados com mais sucesso em Mentalis (91%), orbicularis oris (87%), nasalis (79%), orbicularis oculi (72%).
Quanto à banda de 50-1500Hz recomendada por Conejero, no vídeo a seguir acrescento uma observação baseada em experiência própria, com base também em algo que aprendi em evento da ISIN (Não lembro se foi Jay Shils ou MacDonald que usou o nome de "step artifact" para esse artefato). A estratégia para lidar com esse artefato parece paradoxal: eliminar uma oscilação lenta da linha de base ao permitir uma oscilação muito lenta. Outra estratégia útil para reduzir artefato é, particularmente em orbicularis oculi e frontalis, posicionar o par de agulhas bastante próximos entre si (a 5mm ou menos). A monitorização no vídeo foi feita por uma colega e fiz apenas ajustes remotamente.
Duas sugestões de Conejero podem ser difíceis de reproduzir na prática clínica:
1) Ela fala da importância de captar com eletrodos hookwire, que têm menor área de captação quando comparados a agulhas subdérmicas, para reduzir falsos negativos relacionados a captação de resposta por volume de condução. Pares de agulhas monopolares são alternativa equivalente mais acessível, porém suas dimensões não as tornam convenientes para o registro em território facial. Talvez um par de agulhas subdérmicas posicionadas bastante próximas (a menor de 5mm) reduza também a influência de potenciais gerados a maior distância e produza resultados melhores.
2) Ao posicionar os eletrodos hookwire, mapearam antes, com base em estimulação de facial em forame estilomastoideo, as posições em que obtinham melhor amplitude. Tal mapeamento parece ser inviável na prática e na publicação ela não deu detalhes de quantos reposicionamentos foram, na prática, feitos em razão desse mapeamento e qual foi o ganho de amplitude.
Também deram atenção a descargas neurotônicas, cujo valor já foi bem estabelecido por Romstock. Curioso notar que, como os FcoMEPs eram contínuos, as descargas neurotônicas se sobrepunham aos MEPs. Tanto diante de queda de MEPs como diante de descargas neurotônicas o grupo de Conejero orientava pausa na manipulação e irrigação com soro morno.
Referências:
1. Fernández-Conejero I, Ulkatan S, Sen C, Miró Lladó J, Deletis V. Intraoperative monitoring of facial corticobulbar motor evoked potentials: Methodological improvement and analysis of 100 patients. Clin Neurophysiol. 2022 Oct;142:228-235. doi: 10.1016/j.clinph.2022.08.006. Epub 2022 Aug 24. PMID: 36081239.
2. Kothbauer KF. The Interpretation of Muscle Motor Evoked Potentials for Spinal Cord Monitoring. J Clin Neurophysiol. 2017 Jan;34(1):32-37. doi: 10.1097/WNP.0000000000000314. PMID: 28045855.
"If MEPs are generated rapidly with 1 or 2 trains per second (1–2 Hz), a distinct increase in amplitude is seen in the sequence of recordings. Sometimes even the first MEP appears not at the first stimulation but at the second or third, on which then, and only then the “presence” of the MEP is established. The amplitudes of these rapid MEP series vary significantly and appear to plateau after 7 or 8 stimuli. It is, therefore, impractical if not impossible to determine an amplitude baseline from such recordings, unless one would repeat the stimulation for several seconds and obtain an amplitude average over several recordings once the amplitude has reached its plateau."
3. Téllez MJ, Ulkatan S, Urriza J, Arranz-Arranz B, Deletis V. Neurophysiological mechanism of possibly confounding peripheral activation of the facial nerve during corticobulbar tract monitoring. Clin Neurophysiol. 2016 Feb;127(2):1710-1716. doi: 10.1016/j.clinph.2015.07.042. Epub 2015 Nov 10. PMID: 26564391.
4. Deletis V, Urriza J, Ulkatan S, Fernandez-Conejero I, Lesser J, Misita D. The feasibility of recording blink reflexes under general anesthesia. Muscle Nerve. 2009 May;39(5):642-6. doi: 10.1002/mus.21257. PMID: 19347924.
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